Serra da Freita
neste espaço falam os nossos voluntários...
...que participaram na vigilância florestal,
colheita de sementes,
fazer bolas de sementes, em sementeiras
e plantações
Relatório sobre o
Voluntariado com o
Movimento Gaio
19. Outubro - 20. Dezembro
2019
Pelo Andreas Forstmaier
Andreas Forstmaier é um jovem alemã que estudou em Porto e se juntou ao Movimento Gaio por um tempo.
Segue o seu relatório:
Como me deparei com o projeto
Durante a minha estadia no Erasmus no Porto, ouvi falar de um amigo que muitas vezes ajudou nas plantações do Movimento Gaio.
Quando cheguei pela primeira vez, preparamos um dos plantios que já havíamos criado para os meses quentes. Estava bastante quente, a paisagem montanhosa seca e árida com muitos arbustos pontiagudos que povoam as áreas raspadas pelos incêndios florestais em 2016 e dificulta a sobrevivência de árvores recém-plantadas nos primeiros anos. Difícil imaginar que deveria ter havido floresta aqui. Quando descemos a ladeira banhada em suor ao meio-dia e descansamos por um pequeno riacho na sombra fresca, notei a abundância de vida encontrada em torno dessa linha de vida. Salgueiros, bétulas e carvalhos, samambaias verdes luxuriantes do tamanho de folhas de palmeira em rochas cobertas de musgo e líquen margeavam o fluxo refrescante e claro.
Como aconteceu que a vida que cobria toda a encosta das montanhas só poderia ser preservada nesses retiros?
Grandes áreas da cordilheira foram plantadas por seres humanos com monoculturas, anteriormente pinheiros e agora eucalipto, que trouxeram esse ecossistema florestal, que está em sintonia há milhares de anos, fora de equilíbrio. Com as monoculturas, o fogo costuma ser fácil chegar, pois a capacidade da floresta de armazenar água diminui e algumas das espécies cultivadas são altamente inflamáveis.
Após o incêndio na floresta, nada resta além de terra queimada e tocos de árvores nuas.
Conceito de Movimento Gaio
Chocado com a vista da paisagem queimada, o Movimento Gaio, sem fins lucrativos, quer devolver à região montanhosa da Serra da Freita uma floresta que permanece.
O conceito do Movimento Gaio é reflorestar áreas gerenciadas pela comunidade local (Baldios) com espécies arbóreas nativas. A associação trabalha em estreita colaboração com os grupos locais e tenta envolver voluntários sempre que possível na implementação do projeto. A maioria dos voluntários vem para os projetos individuais da região e das cidades vizinhas, bem como de outros países. Para estadias mais longas de voluntários como parte do Serviço Voluntário Europeu (Serviço Voluntário Europeu EVS ou, mais recentemente, Corpo Europeu de Solidariedade), a organização trabalha com o Rosto Solidário em Santa Maria da Feira e fornece aos voluntários acomodação e dinheiro para sua estadia e refeições.
Informações sobre o trabalho
Onde e o que você trabalha?
As plantações do Movimento Gaio e seus
Os voluntários foram criados numa região montanhosa a cerca de 45 km a sudeste do Porto. Lá você trabalha fora de estrada, em encostas ou no planalto.
Embora o trabalho do Movimento Gaio se concentre na região montanhosa da Serra da Freita, pude conhecer muitos outros lugares durante a minha estadia. Por exemplo, passamos alguns dias dentro e ao redor do Parque Nacional do Gerês para coletar sementes para novos plantios. Nos dias em que não trabalhamos nas montanhas, trabalhamos na região perto do Porto nos dois viveiros de Gondomar e Gaia. Lá, as sementes coletadas são colocadas em vasos, potenciadas e selecionadas para preparar os novos plantações. Às vezes, a associação também organiza eventos em instituições culturais, escolas, lares de idosos etc. para aumentar a conscientização sobre o tema do reflorestamento. Caso contrário, há sempre tempo para fazer algo por conta própria e para explorar a cidade do Porto ou as áreas circundantes.
Um exemplo de dia útil
Hoje acordamos em Cabreiros logo após o nascer do sol. As janelas ainda nubladas pelo orvalho da manhã, começamos a preparar o café da manhã para recarregar as baterias do dia. Logo depois, começamos a dirigir para uma das plantações. Dirigimo-nos para Ameixieira, onde o reflorestamento começou após o incêndio florestal em várias plantações nos Baldios (terras comuns). Lá começamos a plantar faias numa área bastante húmida perto da estrada. Algumas árvores antigas de 1,5 metro de altura e cerca de 30 faias de dois anos.
Mais tarde, fomos trabalhar em uma das maneiras pelas quais limpamos a vegetação rasteira com uma roçadeira nos dias anteriores para plantar uma linha de ciprestes a 1,5 metros de distância. Se forem maiores, devem servir como proteção contra incêndio em caso de incêndio florestal e deslocar os arbustos. Depois de um dia ensolarado de trabalho, Bernardo voltou ao Porto. Eu fiquei mais um
Noite na tenda para continuar o dia seguinte por conta própria e explorar a região.
O que eu aprendi
Antes de tudo, é claro, muito sobre florestas, espécies de árvores, suas propriedades e requisitos de localização e assim por diante. O que achei interessante foi planejar novos plantações.
Como as plantações estão localizadas em áreas onde os incêndios florestais são comuns (quase toda a região montanhosa foi chamuscada em 2016), a plantação deve ser feita com habilidade para torná-la mais resistentes a novos incêndios florestais. A seleção de espécies resistentes ao fogo em regiões vulneráveis do plantio pode ajudar, por exemplo, ou a reconhecimento da simbiose entre diferentes espécies de árvores e fungos (micorrizas).
Além do conhecimento especializado, você aprende muitas coisas práticas. Por exemplo, lidar com a roçadeira e outras ferramentas, plantar árvores, organizar e preparar eventos e, por último, mas não menos importante, um pouco de cultura e língua portuguesa.
Cultura portuguesa. Acima de tudo, isso significa espontaneidade. O fato de um plano ter sido elaborado rapidamente é que muda ainda mais rapidamente.
Você chega no horário combinado ou poucas horas depois, ou não chega. Talvez não exista nenhum plano, basta seguir as circunstâncias, as quais, é claro, podem mudar a qualquer momento. Você fica flexível.
Mas provavelmente a lição mais importante que aprendi do trabalho voluntário é como é difícil restaurar os ecossistemas que se desenvolveram ao longo de milhares de anos e com que rapidez é possível destruí-los. Se queremos estar cercados por florestas intactas no futuro, temos que repensar e agir agora. Isso significa agir, sujar as mãos e ajudar.
Juntos é possível.
O Gaio
Por Tiago Dagall
Vem o Natal, e com ele doze noites escuras de tempo sem tempo até aos Reis, onde a epifania surge, e com ela as portas se abrem para um novo ano... estamos em 2017.
E 2017 começa com uma significativa mudança. Subtil, pois apenas muda o nome, mas significativa pelo que essa mudança representa e pelo peso que uma palavra pode ter, e tem.
O nome Movimento Terra Queimada agradava-me imenso! Ao contrário de outras opiniões que fui ouvindo ao longo do tempo em que faço parte do Movimento, de que o nome Terra Queimada era "negativo" ou "pesado", a mim agradava-me. Agradava porque punha o dedo na ferida, porque nos fazia reflectir sobre uma realidade. Uma realidade dificil de engolir, é certo, mas ainda assim uma realidade, a dos incêndios e da devastação que fica após os mesmos. E uma realidade para a qual creio que era (e ainda é!) crucial chamar a atenção... a da Terra, queimada, exposta, negra, em cinzas, sem vida (à superficie). O fogo, esse, existe e existirá, é elemento vital e parte do sistema. Destroi para transmutar. Mata para regenerar. Leva tudo às cinzas de onde a fénix se ergue. Mas (e dizem por aí, há sempre um mas...) está descontrolado neste País à beira mar plantado. É um grande problema de enormes proporções o dos incêndios, da floresta portuguesa e da gestão territorial. E chamar ao Movimento de Terra Queimada até podia ser forte, chocar, perturbar, mas era precisamente isso que me agradava, porque acabava a ser um abre-olhos, um alerta para esse problema, um motivo de reflexão! Assim, sem rodeios, um olhar sobre o que É...
Mas a vida não pára, e a seguir ao incêndio a vida desponta e a floresta renasce. Lembro de ver o verde começar a rasgar na Freita nas linhas de água pouco tempo após os incêndios. Como lembro também de largas manchas de roxo no meio das cinzas, presente de umas flores das quais não sei o nome. Tudo volta a fazer-se sentir...e o Gaio a fazer-se ouvir!
Fiquei feliz com este nome, muito feliz! Gosto do Gaio. Exerce um certo fascinio sobre mim, e o tempo pára quando os vejo, quando os oiço. Um corvideo, de forte personalidade, atento, barulhento, de bonitas cores. O familiar colorido do negro corvo.
Mais ainda porque este nome também me traz boas memórias. Estávamos em meados de Novembro de 2016, lua cheia, uma super lua, enorme e brilhante, como já não havia assim há umas décadas, diziam os entendidos. E eu, na Serra da Freita, estava na Ameixieira com o "mestre aprendiz" Bernd. Cuidávamos de árvores, da floresta. Entre trabalho radical de arrancar silvas (desculpa Bernd por mandar vir o tempo todo até entender o porquê de estarmos a fazer aquilo), lançar sementes em encostas periclitantes fragilizadas pelos incêndios, e cuidar de pequenas árvores no viveiro, frente à lareira o Bernd falou do Gaio. Da sua admiração por ele, o Gaio, esse amigo do semeador de árvores e florestas. "Bandido!", "Ladrão!" dizem alguns do Gaio por ele esperar pela oportunidade em que possa levar bolotas que se recolheram. Mas não o Bernd, não! Homem atento, inteligente, observador, perspicaz. Comenta comigo, em frente à lareira, de como o Gaio é para ele um amigo. De como gosta de deixar bolotas de propósito para que o Gaio as leve... é que é verdade que ele as leva, sim, e isso é sabido, mas também é sabido (e o Bernd sabe-o!) que enterra-as para mais tarde lhes servirem de alimento. Como também sabe que se esquece de onde enterrou uma boa parte delas. E dessas, uma boa parte vai germinar, e dar origem a um carvalho! Que melhor aliado pode ter um semeador de florestas? Aquilo que à primeira vista pode parecer "mau" (o "bandido" que rouba bolotas), para o observador atento e que não se precipita a tirar conclusões acaba a ser uma vantagem. O suposto ladrão afinal acaba a ser um semea-dor.......................................[momento de reflexão].................................
o Gaio, o belo Gaio! E assim passamos algum tempo, entre outras histórias, a falar do Gaio, e da importância que ele pode ter no sistema (ou organismo como o Bernd gosta de lhe chamar, ao invés de sistema). Hora de dormir. Dia seguinte, de manhã, estou eu no viveiro a passar nogueiras para couvets, e o Gaio ouve-se! "Será que o Bernd o ouviu?" penso eu cá para os meus botões...pergunta parva, é o Bernd, claro que ouviu. Passado um bocado chega à minha beira a dizer que já tinha estado "lá mais em baixo" a deixar bolotas para o Gaio. Ahh, bem que ele tinha dita no dia anterior que o faria! Homem de palavra este, integro e sábio, ora então. E eu presencio tudo isto, e vibro com o momento, com o Gaio, com o Bernd, com as árvores, com a lua cheia, com a vida! E volto para casa, feliz!
E o tempo passa, e o ano começa com a noticia de que o Movimento Terra Queimada passou a chamar-se Movimento Gaio, e a minha alma vibra novamente... pela evolução, pelo nome, pela memória daquele Novembro de lua cheia, pelo Gaio, por ter estado a ouvir o Bernd falar sobre o Gaio e perceber intuitivamente o que ele me dizia, e por assistir a esta regeneração da Terra Queimada.
E porque o foco determina a realidade e a energia segue a atenção, alegra-me o foco e atenção postos no Gaio e o seu papel no Organismo Vivo maior que é a floresta, e ultimamente o planeta. Que o Movimentos Gaio e os seus ajudantes Gaios (corvideos e humanos) continuem a semear árvores pela Serra fora é o que desejo...
Serra ! - por Avani Ankok
O vento agreste da Serra hoje sopra docilmente. É a única testemunha das lágrimas no rosto da Teresa. A ferida viva resultante dos terríveis incêndios do verão reacende no coração ao ver as faixas de pano pintadas à mão pelas crianças das escolas vizinhas no inverno passado tombadas e chamuscadas. Os desejos e intenções puras das crianças sobreviveram à violência das chamas mas agora repousam no silencio da Serra, na terra queimada, no solo negro e morto debaixo dos nossos pés.
Já tinha ouvido falar da aldeia de Ameixieira, perto de Arouca e do Eduardo, jovem amável que cedeu uma casa modesta para o Movimento Terra Queimada criar o Viveiro Florestal. Já tinha ouvido falar do trabalho realizado aqui nos últimos 5 anos pela Teresa e pelo Bernd. Já tinha ouvido falar da distância que ambos, mas mais o Bernd, percorrem muitas vezes a pé desde a casa em Cabreiros até este Viveiro. Mas nada, absolutamente nada me preparou para o que vi, viajei de carro e caminhei com os meus pés.
-2-
São dezenas de kilometros pela Serra da Freita para cima e para baixo, subidas e descidas íngremes, trilhos magníficos que estes dois anjos protectores da Floresta conhecem de olhos fechados, como as palmas dos seus corações. Enquanto caminhamos pergunto-me se o Bernd tem super poderes. Pergunto-lhe directamente se é o Super Homem. Responde quase sempre do mesmo modo quando lhe faço certas perguntas. Sorri. Sorri com humildade, e na sua sabedoria silenciosa reconheço que a dedicação, entrega e amor profundos à causa, à vida, à Floresta é maior que o maior dos cansaços, maior que o maior estado de exaustão. Maior que a fome, o frio, a neve, ou a solidão dos dias gelados na Serra para dar vida às novas futuras Árvores endémicas da nossa floresta nacional.
A maior parte das Árvores plantadas desde 2012 com a colaboração de voluntários, em dias de sol ou de chuva, não resistiu aos violentos fogos do ultimo verão, numa Serra completamente eucaliptizada. E eu, não sei como resistem estes dois anjos valentes, esgotados, cansados e renovados, como por magia, diariamente. Sem carro, sem apoios, sem meios sequer para se deslocar do Porto, onde vivem, para a Serra. No entanto, sorrimos com esperança ao ver alguns pequenos carvalhos, medronheiros e bétulas a crescer, vitoriosamente, quase como que por milagre, com raízes sólidas na terra preta ardida. Neste momento somos todos invadidos por uma enorme felicidade, e quase parecemos crianças.
-3-
Os voluntários para fazer vigilância florestal e prevenção de incêndios podem ter todas as idades e vir de todo o lado. Muitos chegam do norte, outros de Lisboa, Cascais, Malveira. A todos nos move o mesmo amor por caminhar na Mãe Natureza, tomar banho nas cascatas e piscinas naturais dos Rios. Respirar o ar puro da Montanha. Ver voar livre no céu azul a Águia, ouvir a Coruja e o Lobo uivar ao longe de noite, por baixo do sorriso da Lua e das estrelas. A todos nos une um profundo amor e respeito pela Mãe Terra, pela Floresta, pelos Bosques repletos de biodiversidade.
Alguns voluntários tornaram-se amigos próximos do casal. Alguns tem muitas historias e conhecimentos, experiências para partilhar, vontade de aprender. Outros tem historias de vida extraordinárias. Vidas que nos inspiram e motivam, tal como a Teresa e o Bernd, a não desistir, a não baixar os braços, a não nos rendermos. Vidas que nos incitam a caminhar, sempre para a frente, na direcção dos nossos sonhos, abraçando os desafios e as contrariedades que possam surgir.
-4-
Eu venho de Tavira, no sotavento algarvio, geralmente com várias boleias repartidas ou em carros partilhados. As asas do meu coração estão sempre prontas a voar e percorrer todas distancias da Terra para o bem maior e facilmente vem ter a Cabreiros, à adorável casa paroquial, conhecida agora como a casa dos Voluntários vigilantes. O ambiente de convívio, partilha, alegria e comunidade na pequena aldeia pode talvez ser estranho para alguns voluntários no inicio, com os banhos de água fria, com as histórias contadas em frente à lareira em vez da tv ou internet, com poucas das muitas comodidades a que estamos habituados. Mas, na casa paroquial, a energia acolhedora e amorosa da Teresa e do Bernd, e calor dos corações depressa nos faz esquecer todas essas coisas supérfluas, e depressa descobrimos que temos tudo e precisamos de muito pouco.
Na aldeia já não há escola nem crianças. Por vezes pedimos panelas, tachos grandes e colheres, ou um pouco de lenha emprestado às simpáticas vizinhas de cabelinhos bancos. Por vezes, quando devolvemos tudo, com abraços e beijinhos, elas brindam-nos com uma oferta maravilhosa e inesperada, os tradicionais cantos das cantadeiras de Lafões, que ficaram famosos nos anos 80 pela voz única da professora Isabel Silvestre, da aldeia vizinha de Manhouce, em dueto com o Rui Reinhinho dos GNR.
O dia começa cedo. O despertador matinal em Cabreiros são os sinos das vaquinhas arouquesas, naturais desta zona de Lafões, que passam calmamente pelas casas da aldeia em direcção à Serra, onde pastam durante o dia. Já começou a chover, e todos os eucaliptos, milhares de hectares desta invasora resinosa altamente inflamável arderam durante o verão, por isso não esperamos incêndios como aconteceu há duas semanas atrás.
-5-
Com as nossas mãos misturamos um pouco de argila à terra e enrolamos as sementes de sobreiros, azinheiras e carvalhos. As sementes assemelham-se a pequenos bolinhos de terra. Convém que fiquem bolinhas redondinhas e lisas, explica a Teresa. Na festa de despedida da vigilância deste ano negro, os voluntários deixam o seu testemunho, a sua visão, as soluções para o futuro. Sem educação ambiental, sem Floresta e biodiversidade, e sem Árvores endémicas, a vida morre.
Terra queimada, terra renascida, repensada, reflorestada.
Terra viva.
Terra amada.
Terra. <3
Este ano a vigilância dos incêndios terminou. Mas em breve, o coração da Serra da Freita vai voltar a chamar-nos, todos os activistas ambientais para iniciarmos o Programa de Reflorestação. Precisamos de todos. A Teresa, o Bernd, o Movimento Terra convidam todos os voluntários que sintam o coração da Mãe Terra a chamar, a participar nestas acções.
-6-
A próxima é dia 20 de Novembro, para comemorar o Dia da Floresta Autóctone.
Marquem já na agenda por favor, partilhem, divulguem! As inscrições são obrigatórias: movimento.terra.queimada@gmail.com 934386588.
Levamos merenda, luvas e resguardo.
Vamos fazer a primeira plantação no Baldio da Ameixieira. Vamos recuperar o que ardeu no mês de Agosto.
Pretendemos plantar novas plantas, o máximo que podermos.
Por amor, eu vou! "
Novembro 2016, Avani Ankok
Relatório dos vigilantes florestais; Ruan e Alex
Olá,
Conforme o pedido do Bernardo aqui deixo as minhas palavras para os 3 dias que eu e o meu filho Alex passámos na Freita e arredores.
Devo confessar que foi com entusiasmo que me dirigi a Cabreiros para esta ação de voluntariado e foi assim que cheguei à casa paroquial da terra onde fomos recebidos pelo Bernardo.
Após as apresentações saímos para o monte, passando pelo Candal e logo pela Póvoa das Leiras - o Minho nos seus inícios meridionais. Saindo desta povoação apanhámos uma boleia para vencer a ladeira até uma aldeia que não me lembro do nome e exatamente aí fizemos o nosso almoço. Retemperados seguimos para a aldeia de Arada para conhecer os seus 2 últimos habitantes: o senhor António e a sua mulher. E foi a ele que primeiro encontrámos, com as suas 200 ovelhas e 4 cães. Dois dedos de conversa e há que rumar a Arada onde fomos beber uma minis com a sua mulher. Vida dura a deste casal resistente, mais ele do que ela, sim ele um verdadeiro homem da montanha!
No 3° dia e último dia, e com o fogo ainda ativo, de referir que este era um dos muitos ativos em Portugal, decidimos deixar o Bernardo na cobertura fotográfica e seguimos pelo trilho dos Incas. Que dizer? um trilho fantástico que dá uma visão soberba do vale do Paivô, da Serra de Montemuro e ... e... e belas extensões de mato rasteiro a pedir bolas de sementes. Magnífica manhã terminada nas eólicas da Coelheira.
Como o fogo continuou(fomos embora e ainda não estava extinto) o Bernardo continuou na cinza até ser "resgatado" pela Teresa.
Foi lindo de ouvir que o seu leão da montanha estava de volta....
E como afinal a jóia da coroa tinha ficado para trás devido à correria do fogo, tivemos ao final da tarde oportunidade de visitar a mata do Bidoeiro, a famosa aldeia da Ameixieira e as plantações efetuadas nas encostas da Freita. Um final verdejante, aromático, relaxado e de esperança.
E aqui fica o meu registo de 3 dias maravilhosos que passámos em Cabreiros, para os quais muito contribui a simpatia, hospitalidade, conhecimento, vivacidade e boa disposição do casal Markovsky. O meu sincero obrigado e estou certo que nos voltaremos a encontrar.
Grande abraço do Juan.
De novo em Cabreiros fechámos um dia intenso, suado, de horizontes largos...
No segundo dia, e já com o plano estabelecido, rumámos à Freita, só que atrás de nós estava um .... incêndio. Tudo alterado e foi claro o empenho e devoção do casal Markovsky na causa dos incêndios. A partir daí a sua preocupação foi avaliar o estado do incêndio, a sua localização e todos os pormenores importantes para o seu combate. Localizado o incêndio e o seu início, verificou-se que o mesmo progredia em direção à Fraguinha, onde já tínhamos estado no dia anterior, e onde, se localiza um parque de campismo. Foi um dia de corrupio e observação in loco do que significa a praga dos incêndios, a destruição que provoca, a coragem dos combatentes, a destreza dos pilotos dos helicópteros e finalmente a relativa indiferença das populações locais.
Vigilância florestal 2015 – Relato de Nuno Alvim
Seria difícil escolher um momento específico da minha experi-ência como vigilante florestal para vos relatar, pois estão indissociados do todo da experiência, valorizada como um inteiro, sem partes que lhe acrescentasse ou removesse, pois foi assim que me foi permitido viver um espectro imenso de emoções, todas vividas com intensidade; contamos uma só história não dignificaria a minha narrativa de vigilância, ou a do meu amigo Pedro, que me acompanhou. Por isso ocupo alguns segundos da vossa imaginação para vos contar várias, algumas das mais caricatas, porventura as que mais nos divertiram, e com as quais vos espero divertir um pouco.
Talvez não esperássemos um primeiro dia tão intenso, após a nossa chegada a Cabreiros, e nos vermos, no final desse dia, após uma extensa caminha, a regatear o valor de cebolas, ou a agadanhar à vizinhança umas deliciosas couves galegas, vulgo roubar, nem que nos fossem generosamente oferecidas batatas. Certo é, regressávamos à aldeia, as mãos a segurar ramos gigantes de cebola, as malas carregadas de batatas, de sorridos pregados no rosto. O jantar, no cerrar do dia, com o vermelho do sol a colorir o recorte da montanha, e a brisa fresca a infiltrarse pela janela aberta, tornou-se num ritual, e num dos momentos mais agradáveis de cada dia.
Os itinerários vigilantes dos seguintes dias encontraram-nos com vária aventuras, como avistamentos selvagens inesperados, a peregrinação de trilhos duros e bravios, quase encontros com pastores incendiários, caminhos tacteados ao escuro das minas, e em especial, valendo certamente lembrar, as boleias alucinantes que pontuavam os nossos caminhos, como o casal citadino que pedalava a fundo nas curvas, fazendo desleixar seixais pela ribanceira, e aproximando-nos da religião, a mulher vigilante da torre que insistiu em nos levar por caminhos de cabra, que pareciam terrenos acidentados de Marte, e apesar de veementemente desaconselhada, enfiou o seu modesto Peugeot (ou outra marca que me esqueço agora) pela travessa adentro, qual jipe de quatro terrenos, ou ainda mais à frente, a boleia da camioneta de brita e areia, para onde trepamos sem hesitação, já desfalecidos de cansaço, e gozamos de uma refrescante e ventosa viagem pela montanha abaixo, incrédulos com a nossa sorte, ou ainda, nesse mesmo dia, a boleia com o senhor do tasco na aldeia, bombando música pimba espanhola, e que nos levou à porta de casa,
II
entregues como que por uma providência. Histórias para se contar aos netos, diria-se, pois perduram.
Nos desfechos da noite, já exaustos mas reconfortados por banhos de água fria e jantares criativos, eu e o Pedro fazíamos do nosso ritual, ora caminhar pela aldeia, onde dominava um sossego penetrante, e nos deslumbrávamos com o brilho do granito, ou na varanda da casa dos vigilantes, onde permanecíamos deitados pela noite adentro, a contemplar o céu escuro, a contar estrelas cadentes e os satélites que por lá passavam, relembrando os momentos do dia, rindo efusivamente com eles, conversando sobre todos os assuntos do mundo e do universo. Estes momentos eram, confesso, o ápice do dia, em conjunto com as auroras da manhã, quando me levantava sem esforço e lavava a cara na bacia de água fresca, com toda a expansão da montanha iluminada pela minha frente.
Pelo meio, momentos como os mergulhos na cascata selvagem de Manhouce, purificantes, ou ficar deitado sobre as rochas, a escutar o fluxo da água que passava por debaixo, são inesquecíveis, e exigem um regresso ávido, aquela tranquilidade e paz de ser, e que há urgência em preservar.
Foram dias de aprendizagem, de longas caminhadas, de trajectos árduos e esgotantes, de situações inóspitas que conquistamos. Os trajectos, claro, continuarão lá, o que os tornou memoráveis, sobretudo, foi a companhia das pessoas com quem os fiz. O meu amigo Pedro,companheiro dos calos nos pés e cúmplice nas dores e atribulações, e pontuador humorístico.
A Susana, Glória, o Diogo, a Bia, e o Hélder, que encheram a casa de vida ao final da semana, e foram maravilhosos acompanhantes de trilho; Bia, desculpa não poder estar presente, admiro a tua bravura, tua e do Hélder.
A Teresa, o espírito dinâmico e aventureiro deste projecto, uma pessoa de vários rostos interessantes, que sempre nos acolheu com carinho e sinceridade, e de quem tive o prazer de escutar muitas histórias interessantes, sempre surpreendentes.
E o Bernard, esse romântico e louco alemão que luta contra o fascismo ecológico, apaixonado que viu algo de especial e maravilhoso nesta região, amigo e mentor de caminhadas, com quem muito conheci e aprendi, em conversas sobre tudo e alguma coisa que havia para conversar.
Lembro-me em particular de um momento em que lhe perguntei se estava cansado, e ele respondeu-me que não, e quando lhe perguntei de seguida se estava a mentir, ele disse-me que
sim, o que me parece descrever bem a sua forma de ser. No ‘selfpity’, diria-me ele. Estou-te grato, por me ensinares a atravessar silvas e giestas, e mesmo quando as minhas pernas e braços estão a ser trucidados, a cultivar uma paz com a minha dor.